Assessoria de Comunicação
Clara Barufi
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Valor Econômico: Com a Hygo, companhia se posiciona no setor no Brasil
Aquisição da Hygo Energy ocorre após a tentativa malsucedida de abrir capital, pondo em xeque sua capacidade de se capitalizar e expandir os negócios
Por André Ramalho
RIO DE JANEIRO, 14/01/21 – Ao adquirir a Hygo Energy (Golar Power), um dos atores mais ativos no processo de abertura da indústria brasileira de gás natural, a americana New Fortress Energy se posiciona como uma figura de peso no novo mercado de gás em gestação no país. O negócio acontece após a tentativa malsucedida da Hygo de abrir capital, nos Estados Unidos, numa crise que colocou em xeque a capacidade da companhia de se capitalizar e expandir os negócios. Agora, sob nova direção, a expectativa no mercado é que os projetos concebidos pela Golar ganhem um novo fôlego no Brasil.
A maré virou para a Golar Power em setembro, quando o então presidente da empresa, Eduardo Antonello, se tornou alvo de investigações da Lava-Jato por suspeitas de corrupção nos tempos em que ele atuava na Seadrill, em contratos com a Petrobras. A notícia caiu como uma bomba, num momento em que a companhia preparava para abrir capital nos EUA. A operação acabou suspensa na ocasião.
A turbulência ganhou novos episódios nas semanas seguintes, no Brasil. A Petrobras considerou o Grau de Risco de Integridade (GRI) da Golar alto e desclassificou a única proposta válida recebida para o arrendamento do terminal de gás natural liquefeito (GNL) da Bahia. Em sua defesa, a Golar alega que as investigações não têm conexão com suas atividades e são relativas a condutas anteriores ao trabalho de Antonello na companhia. O executivo acabou afastado.
Em seguida, foi a vez da Norsk Hydro anunciar, sem maiores detalhes, o cancelamento, em comum acordo, de um memorando de entendimento para fornecimento de gás para a Alunorte. O combustível seria importado pelo terminal de GNL de Barcarena (PA), onde a Golar está replicando o modelo de geração termelétrica a GNL implementado em Sergipe.
Além da geração a gás, a Hygo vinha desenvolvendo também projetos de distribuição de GNL de pequena escala (numa sociedade em negociação com a BR Distribuidora). Não está claro ainda, contudo, se a iniciativa será mantida.
“Para o mercado brasileiro, a entrada de agentes como a New Fortress pode representar uma adição importante para o adensamento do ambiente concorrencial. É um grupo com muitos ativos [de GNL] já operacionais em pequena escala, por exemplo, além de atuar no negócio LNG-to-Power [termelétricas abastecidas por GNL]. Trata-se de mais uma demonstração de força e atratividade do nosso mercado”, diz o presidente da Gas Energy, Rivaldo Moreira Neto.
Megawhat: Hora de testar a capacidade competitiva do gás do pré-sal
Por Rivaldo Moreira Neto*
A recente aprovação da Lei do Gás na Câmara dos Deputados renovou os ânimos no setor diante da expectativa de efetiva abertura do mercado. A confirmação esperada no Senado combinada à perspectiva real de crescimento da produção a partir de reservas já descobertas e o avanço de medidas de desverticalização lançarão as bases para o desenvolvimento estrutural da cadeia de negócios do gás natural no Brasil.
A nova lei consolida o movimento iniciado com a assinatura, no ano passado, do Termo de Compromisso de Cessação (TCC) entre a Petrobras e o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade). O documento exige ações da estatal em favor da redução da sua posição dominante, com medidas que estimulam um ambiente de negócios menos assimétrico, mais atrativo e, consequentemente, encoraja o surgimento da concorrência na comercialização. Um primeiro efeito concreto já foi observado: é grande o engajamento de consumidores industriais e de produtores e comercializadores privados na busca por efetivar negociações de suprimento.
O passo seguinte para que as novas medidas realmente se traduzam em ganhos de competitividade já a curto prazo depende do endereçamento de questões como a falta de oferta de produtos de flexibilidade e a previsibilidade quanto à abertura dos sistemas de transporte à contratação firme. O texto do PL 4.476/2020 empodera a Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) para buscar ações que possam estimular a concorrência na transição, o que pode significar a resolução do problema da flexibilidade. Quanto ao acesso, a atuação do regulador indica esforços para promover a entrada de terceiros aos sistemas de transporte no menor tempo possível.
Entretanto, ainda falta aos agentes já engajados um horizonte de definições que ancore negociações em andamento. Com a oferta de flexibilidade e a garantia de acesso à rede de transporte, é grande a possibilidade de aceleração da migração de consumidores ao mercado livre em estados-chave, principalmente no Sudeste.
Já para a viabilização de novas reservas que possuem potencial para dobrar a produção nacional, o desafio passa pelo desenvolvimento de projetos estruturantes na demanda. O pré-sal pede escala equivalente ao seu gigantismo – algo que o consumo atual não consegue entregar após mais de uma década de estagnação. O setor privado se organiza e negocia com produtores condições de suprimento futuro que viabilizem investimentos em cadeias produtivas do setor industrial que há muito não assistem a um anúncio de novo investimento no Brasil. Também nesses casos de consumo futuro, a aprovação da nova lei – nos termos validados na Câmara dos Deputados – será um empurrão na direção correta.
A competitividade deste novo gás existe e pode ser aproveitada também pelo setor elétrico, beneficiando um número ainda maior de consumidores. A transição para uma economia de baixo carbono é escolha já tomada no planejamento energético brasileiro, com as fontes renováveis ocupando a base fundamental da expansão na geração. Nesse contexto, o gás pode desempenhar um papel essencial, ao combinar atributos indispensáveis como energia de base, proximidade aos centros de carga e baixos custos de geração.
Atualmente isso não é plenamente possível porque os procedimentos de habilitação de usinas para os leilões de energia exigem a comprovação das reservas de gás responsáveis por seu abastecimento, num modelo que desestimula fortemente a participação de projetos novos de produção. Para tal comprovação, é necessária a aprovação da comercialidade da reserva junto à ANP, por meio da qual o produtor assume uma série de compromissos de investimento na área – antes mesmo de saber se ganhará o leilão de energia e se de fato garantirá a demanda para ao menos parte dos volumes futuros.
A resposta para que tal cenário ocorra no setor elétrico não deve passar, entretanto, pela criação de reservas artificiais de mercado, como a contratação forçada de térmicas pelo interior do Brasil, mas sim por soluções que permitam à nova oferta de gás do pré-sal competir. A possibilidade de uma declaração de comercialidade condicionada, em que o produtor de gás confirme o desenvolvimento das novas reservas apenas se o projeto de térmica sair vencedor num certame, mas dando a garantia de sua existência, pode oferecer um caminho. O que falta não é competitividade nem gasodutos, mas condições para que projetos de larga escala se apresentem à competição nos leilões. Essa questão merece atenção diante da janela de oportunidade cada vez mais apertada para o aproveitamento das riquezas do pré-sal, num contexto de avanço de políticas de descarbonização em todo o mundo e busca concomitante por menores custos tanto no mercado industrial como na geração de eletricidade.
O fato é que, até agora, o mercado não testou a capacidade competitiva do gás do pré-sal. Com os incentivos e timing decisório corretos, os resultados aparecerão e serão decisivos para que o aproveitamento desse potencial auxilie na recuperação da economia brasileira.
* Rivaldo Moreira Neto é CEO da consultoria Gas Energy.
Artigo publicado originalmente em: https://megawhat.energy/news/106799/rivaldo-moreira-neto-escreve-hora-de-testar-capacidade-competitiva-do-gas-do-pre-sal
Megawhat: Hora de testar a capacidade competitiva do gás do pré-sal
Por Rivaldo Moreira Neto*
A recente aprovação da Lei do Gás na Câmara dos Deputados renovou os ânimos no setor diante da expectativa de efetiva abertura do mercado. A confirmação esperada no Senado combinada à perspectiva real de crescimento da produção a partir de reservas já descobertas e o avanço de medidas de desverticalização lançarão as bases para o desenvolvimento estrutural da cadeia de negócios do gás natural no Brasil.
A nova lei consolida o movimento iniciado com a assinatura, no ano passado, do Termo de Compromisso de Cessação (TCC) entre a Petrobras e o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade). O documento exige ações da estatal em favor da redução da sua posição dominante, com medidas que estimulam um ambiente de negócios menos assimétrico, mais atrativo e, consequentemente, encoraja o surgimento da concorrência na comercialização. Um primeiro efeito concreto já foi observado: é grande o engajamento de consumidores industriais e de produtores e comercializadores privados na busca por efetivar negociações de suprimento.
O passo seguinte para que as novas medidas realmente se traduzam em ganhos de competitividade já a curto prazo depende do endereçamento de questões como a falta de oferta de produtos de flexibilidade e a previsibilidade quanto à abertura dos sistemas de transporte à contratação firme. O texto do PL 4.476/2020 empodera a Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) para buscar ações que possam estimular a concorrência na transição, o que pode significar a resolução do problema da flexibilidade. Quanto ao acesso, a atuação do regulador indica esforços para promover a entrada de terceiros aos sistemas de transporte no menor tempo possível.
Entretanto, ainda falta aos agentes já engajados um horizonte de definições que ancore negociações em andamento. Com a oferta de flexibilidade e a garantia de acesso à rede de transporte, é grande a possibilidade de aceleração da migração de consumidores ao mercado livre em estados-chave, principalmente no Sudeste.
Já para a viabilização de novas reservas que possuem potencial para dobrar a produção nacional, o desafio passa pelo desenvolvimento de projetos estruturantes na demanda. O pré-sal pede escala equivalente ao seu gigantismo – algo que o consumo atual não consegue entregar após mais de uma década de estagnação. O setor privado se organiza e negocia com produtores condições de suprimento futuro que viabilizem investimentos em cadeias produtivas do setor industrial que há muito não assistem a um anúncio de novo investimento no Brasil. Também nesses casos de consumo futuro, a aprovação da nova lei – nos termos validados na Câmara dos Deputados – será um empurrão na direção correta.
A competitividade deste novo gás existe e pode ser aproveitada também pelo setor elétrico, beneficiando um número ainda maior de consumidores. A transição para uma economia de baixo carbono é escolha já tomada no planejamento energético brasileiro, com as fontes renováveis ocupando a base fundamental da expansão na geração. Nesse contexto, o gás pode desempenhar um papel essencial, ao combinar atributos indispensáveis como energia de base, proximidade aos centros de carga e baixos custos de geração.
Atualmente isso não é plenamente possível porque os procedimentos de habilitação de usinas para os leilões de energia exigem a comprovação das reservas de gás responsáveis por seu abastecimento, num modelo que desestimula fortemente a participação de projetos novos de produção. Para tal comprovação, é necessária a aprovação da comercialidade da reserva junto à ANP, por meio da qual o produtor assume uma série de compromissos de investimento na área – antes mesmo de saber se ganhará o leilão de energia e se de fato garantirá a demanda para ao menos parte dos volumes futuros.
A resposta para que tal cenário ocorra no setor elétrico não deve passar, entretanto, pela criação de reservas artificiais de mercado, como a contratação forçada de térmicas pelo interior do Brasil, mas sim por soluções que permitam à nova oferta de gás do pré-sal competir. A possibilidade de uma declaração de comercialidade condicionada, em que o produtor de gás confirme o desenvolvimento das novas reservas apenas se o projeto de térmica sair vencedor num certame, mas dando a garantia de sua existência, pode oferecer um caminho. O que falta não é competitividade nem gasodutos, mas condições para que projetos de larga escala se apresentem à competição nos leilões. Essa questão merece atenção diante da janela de oportunidade cada vez mais apertada para o aproveitamento das riquezas do pré-sal, num contexto de avanço de políticas de descarbonização em todo o mundo e busca concomitante por menores custos tanto no mercado industrial como na geração de eletricidade.
O fato é que, até agora, o mercado não testou a capacidade competitiva do gás do pré-sal. Com os incentivos e timing decisório corretos, os resultados aparecerão e serão decisivos para que o aproveitamento desse potencial auxilie na recuperação da economia brasileira.
* Rivaldo Moreira Neto é CEO da consultoria Gas Energy.
Valor Econômico: Petrobras acelera abertura do mercado de gás
Estatal abre infraestrutura de escoamento e processamento do pré-sal e arrenda terminal de GNL na BA
Por André Ramalho
RIO DE JANEIRO, 01/10/2020 – A Petrobras deu mais dois passos, ontem, para abertura do mercado de gás natural para novos agentes. A companhia abriu as propostas para arrendamento de seu terminal de importação de gás natural liquefeito (GNL), na Bahia, e assinou contratos com a Shell, Petrogal e Repsol Sinopec, para compartilhamento das infraestruturas de escoamento e processamento do pré-sal. Esse acordo elimina um dos principais gargalos da abertura, embora ainda não haja expectativas de que o acesso às unidades de processamento (UPGNs) se concretize a curto prazo.
Até o fechamento desta edição, a Petrobras ainda não havia anunciado o nome do novo operador do terminal de GNL baiano. Segundo quatro fontes, a Golar Power (Hygo Energy) apresentou a melhor proposta. O Valor apurou que a empresa e a BP foram as únicas que apresentaram ofertas pelo ativo. A Golar, porém, estava sob risco de desclassificação. A Petrobras informou esta semana que revisaria a análise de integridade da participante depois que o presidente da Golar Power, Eduardo Antonello, virou alvo de investigações da Lava-Jato por suspeitas de corrupção nos tempos em que ele atuava na Seadrill. Antonello se afastou do cargo na Golar para se dedicar à sua defesa.
Joint venture entre a norueguesa Golar LNG e o fundo americano Stonepeak, a Golar Power é uma das empresas mais ativas no processo de abertura do mercado de gás e já possui um terminal do tipo, no Sergipe. A disputa pelo terminal baiano ocorre num momento turbulento para a empresa, que, depois da citação do nome de seu presidente nas investigações da Lava-Jato, teve o seu processo de abertura de capital suspenso nos Estados Unidos. A companhia corre o risco, ainda, de sofrer ações coletivas de investidores americanos.
A expectativa é que o novo operador do terminal da Bahia saia numa posição privilegiada, uma vez que terá condições de entrar no mercado com cargas importadas de gás, num momento em que os preços da commodity estão baixos. O contrato de aluguel da unidade é válido até o fim de 2023. A planta de regaseificação será a primeira do tipo a ser operada pela iniciativa privada, em condições de injetar gás na malha de gasodutos – as unidades da Celse (Golar/ EBrasil Energia), no Sergipe, e da GNA (Prumo Logística / Siemens / BP), no Porto do Açu (RJ) não estão conectadas ao sistema.
Os novos passos da Petrobras representam marcos importantes dentro dos compromissos assumidos com o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade). O presidente da consultoria Gas Energy, Rivaldo Moreira Neto, alerta, porém, que as iniciativas podem não se traduzir na chegada imediata de gás dos novos atores ao mercado. Isso porque as empresas esbarram na falta de previsibilidade sobre quando ocorrerão as chamadas para contratação de capacidade dos gasodutos de transporte.
“Trata-se de um passo importante demais para o processo de abertura, porque elimina algumas das incertezas materiais que ainda seguram o andamento da abertura do setor. Agora, ainda falta o acesso efetivo ao sistema de gasodutos terrestres… Mas, como produtores, eles [Shell, Repsol Sinopec e Petrogal] ficam naturalmente bem posicionados para irem a mercado”, avalia.
A própria Petrobras reconheceu que, para que o contrato de compartilhamento da infraestrutura se traduza numa efetiva utilização do serviço, “ainda são necessárias adequações regulatórias e tributárias precedentes”. O sócio do escritório Machado Meyer, Daniel Szyfman, acredita que a assinatura do contrato, ontem, foi um “marco histórico” e reforça a segurança jurídica da abertura do setor.
Para dimensionar a importância da assinatura dos contratos, a cerimônia virtual da iniciativa contou com o presidente global da Shell, Ben van Beurden. Em nota, a empresa destacou que “dá mais um importante passo no mercado de gás brasileiro” que possibilita a comercialização direta de gás de seus ativos no pré-sal”.
As empresas poderão escoar o gás de seus campos no pré-sal por qualquer uma das rotas de exportação e processá-lo nas UPGNs da Petrobras no eixo Rio-São Paulo. A remuneração do serviço será livremente negociada e, no futuro, outros produtores poderão acessar a infraestrutura, se houver capacidade disponível. Shell, Repsol Sinopec e Petrogal são donas de 17% da produção nacional, mas vendem suas parcelas de gás para a própria Petrobras, devido aos gargalos de acesso ao mercado.
O Globo: Petrobras dá passo rumo à privatização de gasodutos marítimos que ligam campos do pré-sal à terra
Por Ramona Ordoñez
RIO DE JANEIRO, 30/09/2020 – A Petrobras anunciou nesta quarta-feira um importante passo rumo à privatização dos gasodutos marítimos que interligam os campos do pré-sal na Bacia de Santos à terra.
A estatal informou que assina nesta quarta-feira com Petrogal Brasil, Repsol Sinopec Brasil e Shell Brasil contratos de compartilhamento de infraestruturas de escoamento e processamento de gás natural. As petroleiras são sócias em gasodutos offshore (no mar) do pré-sal da Bacia de Santos, entre o litoral do Rio e de São Paulo.
O negócio pode favorecer a abertura de mercado de gás natural no país, como é objetivo do governo federal por meio do novo marco regulatório do setor aprovado no Congresso.
De acordo com comunicado da Petrobras, os contratos preveem a interligação física e o compartilhamento das capacidades de escoamento nas rotas 1, 2 e 3 (a última de propriedade da Petrobras e em fase de construção), dando origem ao Sistema Integrado de Escoamento de gás natural (SIE).
“No futuro, outras empresas produtoras de gás natural poderão aderir aos contratos vigentes, observados os seus dispositivos e desde que haja capacidade de escoamento disponível no sistema”, acrescentou a empresa em nota.
Atualmente, a Petrobras tem em operação a Rota 1, que liga o Campo de Lula, por meio do campo de Mexilhão, à Unidade de Processamento de Gás (UPGN) de Caraguatatuba, em São Paulo, e a Rota 2, que escoa a produção de Lula e outros campos até Cabiúnas, em Macaé, no Estado do Rio de Janeiro.
A Rota 3 ainda está em construção e vai transportar o gás do campo de Búzios e outros campos até a UPGN do Comperj, que também está em construção.
As três rotas em operação terão capacidade de cerca de 48 milhões de metros cúbicos por dia de gás natural a serem transportados por essa malha.
O diretor-presidente da consultoria Gas Energy, Rivaldo Moreira Neto, destacou que o anúncio dos contratos assinados entre a Petrobras e seus parceiros nos gasodutos do pré-sal é fundamental para a abertura do mercado de gás natural à competição.
Com os contratos, a Petrobras, seus sócios nos campos do pré-sal, Shell, Galp, Repsol e Sinopec poderão definir os preços do próprio gás no momento de sua venda ao mercado.
— As negociações de compra e venda de gás entre privados ganha novo impulso com a medida. Uma incerteza a menos. Essas três petroleiras terão que ir a mercado para garantir a saída do gás associado. E, agora, eles terão as condições de acesso (custos para escoar o gás e processá-lo) definidas — destacou Rivaldo Neto.
Em seu comunicado, a Petrobras explicou ainda que, além do SIE, também estão previstos contratos que irão constituir o Sistema Integrado de Processamento de gás natural (SIP), que contempla o acesso das empresas às unidades de processamento, de propriedade da Petrobras, localizadas em Caraguatatuba, em São Paulo, e Cabiúnas e Itaboraí (em construção), ambas no Rio de Janeiro.
Valor Econômico: Distribuidoras testam abertura do setor de gás
Companhias do Nordeste buscam novos supridores
Por André Ramalho e Gabriela Ruddy
RIO DE JANEIRO, 14/09/2020 – As distribuidoras de gás canalizado esperam reduzir a dependência da Petrobras a medida em que a abertura do mercado brasileiro se consolide. No Nordeste, as concessionárias locais se preparam para lançar ainda neste ano uma nova chamada pública conjunta, de olho na janela aberta pela entrada de novos agentes, seja na produção de campos maduros terrestres, seja na importação de gás natural liquefeito (GNL). As pretensões, contudo, podem esbarrar nas dificuldades dos fornecedores em acessar a infraestrutura.
Atualmente, a Petrobras é a única fornecedora relevante para as distribuidoras, que têm pressa na busca por fontes alternativas e melhores preços. A maioria das concessionárias do Nordeste tem contrato com a estatal até o fim de 2021, o que exige negociações com novos agentes desde já.
Para os novos atores do mercado de gás o Nordeste é visto como uma possível porta de entrada, uma vez que, no Centro-Sul, as distribuidoras têm contratos mais dilatados com a Petrobras, até o fim de 2023 em geral. O Valor apurou, contudo, que algumas das empresas do Sul também estão de olho nas oportunidades e se preparam para tentar novas chamadas públicas, para reforçar o suprimento.
A ideia de uma chamada pública coordenada é dar escala à contratação – algumas das empresas do Nordeste movem volumes inferiores a 1% do mercado. Juntas, elas representam cerca de 10% do volume de vendas do Brasil no primeiro semestre – desconsiderada a Bahiagás, que tenta emplacar uma chamada individual.
Em 2019, as distribuidoras locais fizeram um primeiro teste, frustrado. Poucas empresas – como a Golar e Shell – chegaram a apresentar propostas, mas, na prática, a única que conseguiu avançar nas negociações foi a própria Petrobras, dada as dificuldades dos concorrentes de acesso à infraestrutura.
“A chamada escancarou os gargalos, o aprendizado foi útil”, explicou o presidente da Cegás (CE), Hugo Figueirêdo. “A expectativa é que até lá [fim de 2021] uma série de questões discutidas no âmbito infralegal e legal [sobre o acesso de terceiros à infraestrutura] possa ter sido implementada”, disse.
Para que novos fornecedores entrem no jogo, porém, Figueirêdo afirma que é preciso que as transportadoras avancem com a oferta da capacidade disponível dos gasodutos. “Não sei se será possível até o fim de 2021 termos acesso à capacidade de transporte com tarifas já definidas”, disse.
No Nordeste, a malha de gasodutos é operada pela Transportadora Associada de Gás (TAG), que mantém conversas com a Agência Nacional do Petróleo (ANP) e Petrobras para definir a real capacidade disponível dos seus gasodutos, a fim de ofertá-la em 2021.
Além dos novos produtores terrestres, a Cegás aposta também no biometano produzido em aterros sanitários – 17% do gás distribuído pela empresa vem dessa fonte.
As distribuidoras acompanham, ainda, as oportunidades de importação de GNL, em meio ao processo de arrendamento do terminal da Petrobras na Bahia. BP, Shell, Total, Repsol, Golar, Excelerate, Naturgy, Compass, Eneva e Bahiagás disputam o ativo.
Apesar dos obstáculos, a presidente da Potigás (RN), Larissa Dantas, está confiante na queda nos preços para as distribuidoras. A expectativa, segundo ela, é que a competição reduza os custos de compra em até 35% em relação aos preços da Petrobras. “Uma tarifa de gás mais competitiva traz oportunidades imensas para o Estado”, comenta a executiva, que mantém conversas com supridores de GNL e produtores nacionais como a 3R Petroleum e Petrorecôncavo – com a qual tem um memorando de entendimentos.
A Petrorecôncavo opera o Polo Riacho da Forquilha (RN), depois de comprá-lo da Petrobras por US$ 356,3 milhões. O presidente da petroleira, Marcelo Magalhães, afirma que tem condições de cobrar entre US$ 4 e US$ 4,5 o milhão de BTU (unidade térmica britânica) pela molécula. Para efeitos de comparação, a Petrobras começou o ano vendendo o gás a US$ 7 o milhão de BTU, mas hoje esse valor é inferior a US$ 5 o milhão de BTU, devido à desvalorização do petróleo, ao qual o gás está indexado.
Magalhães se queixa dos entraves que dificultam novos contratos. “Havia a expectativa de que as negociações para acesso de terceiros à infraestrutura sairiam este ano, mas ainda não conseguimos evoluir muito nas negociações”, disse o executivo.
A Petrobras se comprometeu junto ao Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) a abrir suas UPGNs – acesso que será obrigatório com a Nova Lei do Gás, em tramitação no Senado. Procurada, a Petrobras esclareceu que está comprometida com a abertura e com os compromissos assumidos e que já publicou minuta de contrato de processamento para 13 empresas que manifestaram interesse no acesso.
A Petrorecôncavo vende hoje o seu gás para a Petrobras a preços baixos e, por isso, produz abaixo da capacidade, para poupar reservas. A infraestrutura da estatal em Guamaré (RN) foi colocada à venda, mas a expectativa é que o desinvestimento leve cerca de 18 meses. O governo local pediu à Petrobras que permita o acesso antes do negócio. A estatal alega que está vendendo a UPGN “exatamente no sentido de contribuir cada vez mais para que outros ‘players’ possam entrar e atuar no mercado”.
Enquanto isso, o presidente da Gas Energy, Rivaldo Moreira Neto, acredita que só haverá espaço para contratos mais relevantes de suprimento a partir de 2022. “Mas é preciso começar a construir as negociações. As distribuidoras terão um papel importante neste novo momento do mercado, porque são grandes contratantes”, explica.
O advogado Felipe Feres, sócio do escritório Mattos Filho, por sua vez, destaca que a Nova Lei do Gás traz a segurança jurídica para destravar o setor. “Vamos ver em breve novos acordos [de fornecimento], tanto com distribuidoras quanto consumidores livres”, afirma.
Valor Econômico: Abertura do gás estimula concorrência por mercado
Produtores e comercializadoras terão condições de competir com Petrobras
Por André Ramalho
RIO DE JANEIRO, 03/09/2020
A abertura do mercado brasileiro de gás natural deu mais um passo, nesta semana, com a aprovação da Nova Lei do Gás, na Câmara. Na expectativa de que o novo marco legal abrirá caminho para uma maior competição, numa indústria hoje amplamente dominada pela Petrobras, empresas têm buscado se posicionar no tabuleiro, para concorrer com a estatal nesse novo negócio em construção.
Produtores de gás no Brasil e fornecedores globais de gás natural liquefeito (GNL), como a Shell, Equinor, Repsol, Galp, Eneva e BP, e comercializadoras de gás – como a Compass (Cosan) e Gas Bridge (que conta com investimentos da Lorinvest) – despontam como candidatos a concorrentes da Petrobras nos próximos anos. Outros agentes como a Prumo Logística e a Golar, principais investidores privados de terminais de GNL no país, além da Engie e Brookfield – donas das transportadoras TAG e NTS, respectivamente – têm preenchido um espaço cada vez mais aberto à iniciativa privada na infraestrutura do gás.
Um dos grandes méritos da Nova Lei do Gás é obrigar a Petrobras a abrir para terceiros a sua insfraestrutura – como gasodutos de escoamento, unidades de processamento e terminais de GNL. O objetivo do projeto de lei, que segue agora para o Senado, é eliminar um dos principais entraves à abertura: a dificuldade de produtores e fornecedores de GNL de acessar o mercado consumidor, devido à posição dominante da estatal brasileira na infraestrutura.
Hoje, a Petrobras responde por 76% da produção total de gás no Brasil. Na prática, contudo, ela é praticamente a única fornecedora relevante do mercado. Isso porque outros importantes produtores, como a Shell, Repsol, Petrogal e Equinor, sócias da estatal em campos produtores, vendem suas parcelas de gás para a própria Petrobras, porque enxergam dificuldades no acesso ao mercado. Pela lei vigente, o dono da instalação não é obrigado a abrir capacidade.
O cenário, contudo, está mudando. A estatal brasileira se comprometeu junto ao Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) a não comprar mais gás de seus parceiros e a negociar o acesso – remunerado – a sua infraestrutura. A expectativa da Petrobras é que, com a consolidação da abertura do mercado nos próximos anos, ela passe a responder por 50% da oferta de gás no país.
Alguns desses contratos de compra de gás de terceiros começam a vencer já entre 2021 e 2022, o que tem gerado uma corrida dessas empresas ao mercado, na tentativa de assegurarem um destino para seus volumes. Um desses produtores é a Equinor, que tenta viabilizar contratos já para o ano que vem, para a parcela de gás a que tem direito no campo de Roncador, no pós-sal da Bacia de Campos. A norueguesa também busca tirar do papel o projeto de produção da descoberta de Pão de Açúcar e procura clientes, em conjunto com a sua sócia Repsol Sinopec.
A vice-presidente de comercialização da empresa no Brasil, Cláudia Brun, conta ao Valor que a companhia tenta negociar o gás de Roncador tanto com indústrias, no mercado livre, quanto com distribuidoras. Ela destaca que a Nova Lei do Gás, se aprovada no Senado, é um passo muito importante para diminuir incertezas, mas que o projeto é apenas o começo de uma agenda regulatória mais ampla, que ainda precisa avançar.
“Existem ainda desafios grandes [para a abertura do mercado] por não haver clareza sobre algumas questões regulatórias”, disse a executiva, ao citar, como exemplo, a falta de um calendário de chamadas públicas para contratação de capacidade dos gasodutos – etapa fundamental para que os vendedores consigam entregar o gás aos clientes por meio malha existente.
Outra multinacional que corre contra o tempo para monetizar o seu gás é a Shell. O presidente da empresa no Brasil, André Araujo, disse que a Nova Lei do Gás é um “excelente passo” para a abertura do mercado, mas que o Brasil ainda precisa continuar a aperfeiçoar a regulação do setor. Ele citou a necessidade de ajustes nas regras dos leilões de energia para possibilitar a contratação de termelétricas que consumam o gás do pré-sal. A Shell tenta tirar do papel o projeto de Gato do Mato, na Bacia de Santos, e vê na geração a gás uma estratégia de integração da companhia.
“Se quisermos participar do leilão de energia [com uma térmica que consuma o gás de Gato do Mato, por exemplo], temos que mostrar que possuímos reserva e infraestrutura para atender à usina. Mas para nós, do ponto de vista do investidor, precisamos saber como vai ser o acesso desse gás ao mercado, para justificar o investimento em infraestrutura”, disse. “É aquela discussão sobre o que vem primeiro: o ovo ou a galinha”, completou.
A Shell já é sócia de uma termelétrica em construção em Macaé (RJ), junto com o Pátria Investimentos e a Mitsubishi, e tenta replicar o modelo. No caso específico da usina Marlim Azul (565 megawatts), ela consumirá gás da parcela da Shell nos campos operados pela Petrobras no pré-sal e que já têm infraestrutura de escoamento pronta.
O clima entre as petroleiras, transportadoras e grandes consumidores era de vitória ontem, após a aprovação na Câmara. O Instituto Brasileiro do Petróleo e Gás (IBP) comemorou o avanço da tramitação do tema no Congresso, por criar as bases para investimentos e para um mercado competitivo.
Para o presidente da Gas Energy, Rivaldo Moreira Neto, a expectativa é que, conforme a abertura do mercado se consolide, novos agentes comecem a aparecer. “A lei não assina contrato, mas dá um passo certo para que a competição apareça. Veremos cada vez mais novos ofertantes, comercializadores privados, investimento em estocagem. Os desinvestimentos da Petrobras em águas rasas e em terra trazem também agentes novos. Um mercado mais aberto cria um ambiente mais propício para que produtores menores criem seus modelos de negócios”, comenta.
Dentre os pequenos produtores com vocação para o gás estão, por exemplo, a 3R Petroleum, que se consolidou, via aquisições, como o maior produtor de gás do Rio Grande do Norte; e a Alvopetro, dona da primeira unidade de processamento privada do país, construída por ela própria na Bahia.
Já o diretor do Centro Brasileiro de Infraestrutura (CBIE), Adriano Pires, acredita que o projeto de lei aprovado pode não ser suficiente para viabilizar os novos projetos de gás do pré-sal. O consultor apoia o pleito das distribuidoras na defesa da inclusão, em lei, de incentivos à expansão da malha de gasodutos por meio da instalação de térmicas no interior. Segundo Pires, o mercado de gás atual não é suficiente para absorver o crescimento esperado da oferta. Os demais agentes alegam, por sua vez, que a competição reduzirá os preços, trazendo competitividade para a reindustrialização do país, e, assim, aquecer a demanda.
Gazeta do Povo: O que propõe a Nova Lei do Gás – e quais os seus méritos e defeitos, segundo o setor
Por Jéssica Sant’Ana
BRASÍLIA, 01/09/2020 – O plenário da Câmara dos Deputados deve votar nesta terça-feira (1º) o novo marco legal para o mercado de gás natural. A Nova Lei do Gás, como foi apelidada, aumenta a competição no setor, acabando de vez com o monopólio da Petrobras, e promete reduzir os custos de transação para a indústria, principal interessada no combustível.
O projeto é uma das prioridades do ministro da Economia, Paulo Guedes, para a retomada da economia no pós-pandemia, pelo potencial de gerar o que ele define como “choque de energia barata” em médio e longo prazo. A equipe econômica estima que o marco pode atrair R$ 630 bilhões em investimentos em dez anos.
O texto que será votado em plenário é o mesmo aprovado no ano passado por unanimidade pela Comissão de Minas e Energia (CME), sob relatoria do deputado Silas Câmara (Republicanos-AM). O relator em plenário é o deputado Laércio Oliveira (PP-SE), que optou por não fazer modificações no projeto, apesar da pressão da oposição e das distribuidoras de gás, que querem incluir mecanismos de estimulo à demanda para garantir que o gás natural chegue ao interior do país. Eles vão tentar fazer alterações via emendas em plenário.
O governo e a indústria são favoráveis à aprovação do projeto como está, sem modificações. Eles dizem que texto realiza ampla reformulação do marco regulatório do setor ao acabar com o regime de concessão e permitir que novos gasodutos sejam construídos através do regime de autorização; ao mudar a legislação para obrigar em lei a Petrobras a abrir seus dutos para terceiros; ao reduzir subsídios cruzados para desenvolvimento do setor; e ao trazer suporte legal e segurança jurídica aos investidores privados.
“Além de impedir a formação de novos monopólios, a nova lei dá segurança jurídica de longo prazo para novos investimentos, à medida que estabelece a obrigatoriedade de acesso a terceiros para as novas infraestruturas essenciais e reforça o poder da ANP [Agência Nacional de Petróleo] para adotar medidas que assegurem o pleno desenvolvimento do mercado”, diz o CEO da consultoria Gas Energy, Rivaldo Moreira Neto.
A Empresa de Pesquisa Energética (EPE), estatal federal que ajudou na elaboração do novo marco, lembra que a proposta foi amplamente discutida nos últimos sete anos no âmbito dos programas Gás para Crescer e do Novo Mercado de Gás. “A aprovação do PL 6.407/2013 está em consonância com a visão de aumento da vantagem competitiva do setor de gás brasileiro frente à crescente liquidez e competitividade do mercado, buscando a retomada do crescimento econômico pós-pandemia e alinhamento com as melhores práticas da indústria”, diz em nota técnica.
Nova Lei do Gás não esgota todos os desafios, dizem indústria e especialistas
Apesar de defenderam a aprovação do texto da forma que está e de elogiarem os avanços trazidos pela nova legislação, indústria e especialistas em energia dizem que a proposta não esgota todas as condições para aumentar a competitividade e os investimentos e para criar um ambiente favorável à redução dos preços do mercado de gás natural.
“O texto da nova Lei do Gás, na condição em que se encontra, contribui muito para consolidar avanços fundamentais para o setor de gás natural. O projeto não esgota, porém, todas os desafios para que a abertura do mercado de gás se consolide, mas entendemos que é importante que nem todas as soluções venham por meio de uma lei. Uma regulação ativa e bem coordenada com o mercado é parte essencial para se chegar aos resultados esperados com a liberalização”, explica Moreira Neto.
“A aprovação do PL, coordenada com o avanço infralegal de agenda regulatória no âmbito da ANP, vai dar grande impulso para a concretização de novos investimentos a partir do gás natural”, completa o especialista.
Ele diz que no âmbito regulatório ainda é preciso equacionar duas questões principais: a falta de previsibilidade quanto à realização das chamadas públicas para acesso efetivo às malhas de transporte de gás natural no Sudeste e no Nordeste; e a ausência de instrumentos que permitam aos produtores e comercializadores privados garantir suprimento, uma vez que eles não dispõem das mesmas condições da Petrobras.
“Esses dois instrumentos são fundamentais para viabilizar os contratos de gás no mercado livre e dependem, em nossa visão, de maior e melhor coordenação entre os agentes envolvidos na transição para seu devido endereçamento”, finaliza.
O presidente-executivo da Associação Brasileira das Indústrias de Vidro (Abividro), Lucien Belmonte, cita outro ponto de atenção para o desenvolvimento do mercado do gás: que a Petrobras cumpra o acordo feito com o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), o que não vem acontecendo, na sua avaliação.
O acordo foi o primeiro passo para aumentar a competição no setor de gás natural, já que a Petrobras tinha o monopólio da produção, transporte e distribuição. No termo de compromisso assinado com o Cade, a estatal se comprometeu a vender suas transportadoras de gás natural e também se desfazer de participação acionária indireta em companhias distribuidoras.
Ela pode fazer isso vendendo suas ações da Gaspetro – sociedade entre a Petrobras (51%) e Mitsui Gás (49%) – ou fazendo a Gaspetro vender suas participações nas companhias distribuidoras. Todos os desinvestimentos precisam ser cumpridos até 31 de dezembro de 2021.
Patrícia Agra, especialista em energia do escritório do L.O. Baptista Advogados, lembra ainda da necessidade de harmonização da lei nacional com as leis locais. “Não adianta a lei federal se tem uma lei estadual aqui em São Paulo que não permite que terceiros distribuam gás natural. Vai ser necessário todo esse arcabouço legal para garantir segurança jurídica ao investidor.”
Distribuidoras querem usinas térmicas para garantir demanda
As distribuidoras de gás, representadas pela Abegás, querem algumas mudanças no projeto. A principal delas é a garantia de demanda. Elas defendem que o projeto inclua uma política energética que garanta a contratação do gás natural pelas usinas térmicas “inflexíveis”, que são as principais demandantes do combustível no Brasil, ao lado das indústrias. As térmicas inflexíveis são aquelas que têm toda a energia comercializada por contratos bilaterais.
Segundo a Abegas, somente com a garantia de demanda será possível estimular a construção de dutos de transporte de gás natural até o interior do país, onde estão muitas fábricas. Atualmente, a malha de dutos no Brasil é muito pequena, com 9,4 mil quilômetros, e praticamente restrita à costa, mais próxima das plataformas de extração de petróleo e gás.
“Os produtores não têm como escoar [o gás natural], nem como chegar aos mercados, por causa da falta de infraestrutura de transporte”, diz Rafael Lamastra Jr., CEO da Compagas – distribuidora de gás natural no Paraná – e vice-presidente do Conselho de Administração da Abegás. “O PL da Nova Lei do Gás trabalha muito bem para aqueles que já têm gás, mas zero pra quem não tem gás. Vai manter a distribuição de gás somente para quem já tem acesso, porque não incentiva a interiorização dos dutos.”
Ele cita como exemplo as cidades paranaenses de Londrina, Maringá, Cascavel e Toledo, todo o Oeste de Santa Catarina e todo o interior do Rio Grande do Sul como potenciais interessadas em comprar gás natural, mas hoje desassistidas pela falta de interiorização dos dutos.
Segundo Lamastra Jr, sem garantir a demanda para o produto, através das usinas térmicas, os investimentos privados não chegarão – ou ficarão restritos à costa. “A solução térmica é a mais barata e fácil para desenvolver o mercado de gás natural. Não vão conseguir expandir [a malha de gasodutos] sem solução térmica”.
Patrícia Agra, especialista em energia do escritório do L.O. Baptista Advogados, concorda que é necessário garantir demanda para incentivar a atração de investimento privado em rede de gasodutos. “O governo tentou flexibilizar umas etapas, tirando o monopólio da Petrobras, liberando para destituição do gás e tentando fomentar o consumo, mas o setor de gás natural precisa ter oferta, meio de transporte e demanda para se desenvolver”, explica.
Ela lembra que as indústrias – principais consumidores do gás natural, ao lado das térmicas – precisam que a tubulação de gás natural chegue até onde elas estão. “Para isso, é preciso criar essa demanda no mercado secundário. Ligar às térmicas é uma solução”, diz.
O governo é totalmente contrário a essa ideia, que classifica de subsídio cruzado. “É preciso tomar cuidado para não promover gás natural barato às custas da energia elétrica cara”, diz a EPE em nota técnica.
“A presença de térmicas inflexíveis deve ser vista com muita cautela, pois pode desperdiçar gás e recursos renováveis para geração de energia, impondo o pagamento por energia não consumida. Isso pode prejudicar a competitividade da energia elétrica para a indústria e as pessoas”, completa.
Para a EPE, os investimentos em expansão da infraestrutura de gasodutos devem se pautar por estudos que demonstrem eficiência e competitividade. “Os setores de gás natural e energia elétrica têm potencial de crescerem juntos, de forma sustentável, desde que haja uma alocação equilibrada de custos e riscos, tomando cuidado com subsídios cruzados.”
Lamastra Jr. nega que a proposta da Abegás proponha subsídio cruzado e diz que não há como desenvolver o setor, como o governo promete, sem estímulo à demanda via térmicas.
O CEO da consultoria Gas Energy, Rivaldo Moreira Neto, diz que a adoção de regras rígidas, que imponham a localização de projetos de consumo novos para garantir a construção de gasodutos, se distancia dos objetivos da modernização do mercado de gás natural.
“A maneira de se incentivar o crescimento da produção de gás natural que tenha o setor elétrico como uma de suas âncoras passa pela possibilidade de se permitir que um projeto de térmica baseada em gás novo (aquele ainda sem rota de escoamento construída) consiga participar dos leilões de contratação de energia”, defende.
Valor Econômico: Abertura do setor ainda tem algumas pendências
O ritmo da abertura da indústria do gás poderá ser maior ou menor a depender do avanço da agenda regulatória
Por André Ramalho
RIO DE JANEIRO, 17/08/2020 – Os agentes do mercado de gás natural estão confiantes de que o novo marco legal do setor começará a destravar investimentos – possivelmente – no curto prazo. O ritmo da abertura da indústria do gás, no entanto, poderá ser maior ou menor, a depender do avanço da agenda regulatória e do cumprimento do termo de compromisso da Petrobras com o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), além, claro, da própria dinâmica da iniciativa privada no desenvolvimento de projetos.
Há um certo consenso no mercado de que a Nova Lei do Gás avança, ao mudar o regime de outorga de novos gasodutos (da concessão para autorização), e ao obrigar, em lei, a Petrobras a abrir a sua infraestrutura para terceiros.
A legislação não esgota, porém, todas as pendências, para que a abertura se consolide. Antes da construção de novos gasodutos, por exemplo, falta resolver quando a capacidade disponível da infraestrutura já existente será ofertada. Transportadores prometem para 2021 as chamadas públicas para contratação dessa capacidade, mas ainda não há um calendário oficial que dê previsibilidade aos agentes. Sem acesso aos gasodutos, os novos supridores não conseguem atender ao mercado.
“Só segurança jurídica não atrai investimento. Qualquer negociação no mercado livre, hoje, tem nessa incerteza [sobre o acesso aos gasodutos] algo bastante delicado”, afirma o presidente da Gas Energy, Rivaldo Moreira Neto.
O executivo de uma petroleira afirmou, sob a condição de anonimato, que a própria abertura da infraestrutura da Petrobras, ao fim do dia, passa também por um entendimento sobre a remuneração dos ativos e do olhar dos reguladores sobre eventuais abusos.
O sócio do escritório Vieira Rezende, Ricardo Martinez, lembra também que o mercado livre de gás passa pelo avanço das regulações estaduais. “Cabe aos estados adaptarem as suas legislações, para que a indústria possa usufruir de todos os benefícios da abertura”, afirma Martinez.
A Abegás, representante das distribuidoras, destaca a importância da inclusão, em lei, de mecanismos de estímulo à criação da demanda, sob o risco de que, mesmo com a segurança jurídica, não haja mercado suficiente para absorver a oferta crescente. As distribuidoras defendem que a Nova Lei do Gás inclua uma política energética para propagação de termelétricas inflexíveis (de uso contínuo) de forma a viabilizar a interiorização dos dutos. “Não podemos perder essa janela de oportunidades para que o gás seja universalizado. Precisamos buscar a integração do sistema elétrico e do gás”, disse o diretor de Estratégia e Mercado da Abegás, Marcelo Mendonça.
As distribuidoras são o ponto dissonante no debate sobre a Nova Lei do Gás. Representantes das indústrias, produtores, transportadores se juntaram numa espécie de coalização em defesa do projeto apresentado pelo relator na Câmara, o deputado Laércio Oliveira (PP/SE). O grupo defende que a modernização do setor não comporta mais subsídios cruzados que promovam a expansão dos dutos às custas de tarifas de energia mais caras. Mendonça rebate que o subsídio já existe no modelo atual, para bancar as térmicas flexíveis.
Segundo o secretário especial de Produtividade, Emprego e Competitividade do Ministério da Economia, Carlos da Costa, a demanda virá naturalmente, a medida em que haja mais competição. “Quando trazemos concorrência, as margens [dos elos da cadeia] reduzem muito”, afirmou.
Para o secretário-executivo de gás do Instituto Brasileiro de Petróleo (IBP), Luiz Costamilan, a nova lei traz condições de competição já “no curtíssimo prazo”.
Valor Econômico: Brasil devolve 42% do gás que produz para os poços
Reinjeção do insumo dispara nos últimos quatro anos
Por Daniel Rittner
BRASÍLIA, 14/08/2020 – Sem um mercado robusto e com limitações no acesso à infraestrutura de escoamento, o Brasil devolve para seus poços 42% de todo o gás natural que produz diariamente. O volume reinjetado nas jazidas quase dobrou – de 27,6 milhões para 52,6 milhões de metros cúbicos por dia – nos últimos quatro anos, período que coincide com o aumento da exploração no pré-sal.
As petroleiras, incluindo a Petrobras, defendem esse processo e enfatizam sua importância para maximizar a produção de óleo nos reservatórios. Para a indústria e especialistas, embora haja razões técnicas para a reinjeção, isso significa dar um uso menos nobre ao gás e enterrar a possibilidade de uma energia mais barata aos consumidores. De qualquer forma, uma parte do que volta para os poços não é mais recuperada e se perde para sempre.
O novo marco legal do gás, pronto para votação no plenário da Câmara dos Deputados, pode mudar essa equação. Um dos pontos do projeto de lei (PL 6.407 de 2013) é a garantia de “acesso não discriminatório e negociado de terceiros” aos gasodutos de escoamento da produção. São os dutos, no início da cadeia, que ligam os poços produtores às unidades de processamento de gás (UGPNs). Hoje o acesso à infraestrutura pode ser simplesmente recusado por seus donos, mesmo se houver ociosidade, por mera opção comercial.
Além dos obstáculos no acesso à infraestrutura, o CEO da consultoria Gas Energy, Rivaldo Moreira Neto, aponta entraves técnicos e econômicos. O grande eixo de crescimento da produção nos últimos anos foi o pré-sal, que tem petróleo leve e com baixo teor de enxofre, mas um gás associado com elevada concentração de gás carbônico. “Em campos como Búzios, por exemplo, o percentual é bastante alto”, afirma.
Para evitar a formação de ácidos nos dutos e aumentar a recuperação de petróleo retido nos poços, mantendo a pressão nos reservatórios, reinjeta-se não apenas água, mas o próprio gás natural. “A falta de infraestrutura é um problema, mas às vezes a reinjeção é a melhor solução técnica.”
Em seminário virtual organizado pelo Instituto Brasileiro de Petróleo (IBP), em junho, a diretora de refino e gás natural da Petrobras, Anelise Lara, argumentou que o processo de reinjeção “tem o potencial de aumentar a produção de dez a 15 pontos percentuais”. “Obviamente não podemos abrir mão dessa riqueza. São bilhões de barris de petróleo que podem ser produzidos a mais se considerarmos esses campos”, observou a executiva.
Para alguns críticos, no entanto, os volumes de reinjeção cada vez maiores indicam ausência de prioridade na criação de um mercado de gás. Desde 2011, enquanto a produção nacional subiu cerca de 90%, a quantidade de gás devolvido aos poços cresceu 375%. No campo de Urucu (AM), mais da metade do que sai volta à terra por impossibilidades de escoamento do insumo.
O superintendente da Associação Brasileira das Indústrias de Vidro (Abividro), Lucien Belmonte, diz que um preço mais alinhado aos valores internacionais poderia reativar imediatamente uma demanda de 5 milhões de metros cúbicos por dia.
Belmonte comenta que setores como o químico, de fertilizantes e siderúrgico deixaram de consumir gás nos últimos anos por causa dos altos preços. Nesses casos, não se trata apenas de uma fonte de energia, mas matéria-prima usada nos processos produtivos.
O problema da reinjeção, segundo ele, é que parte do gás não retorna mais. “Pode interessar às petroleiras, mas interessa à União? Os especialistas calculam que cerca de 30% do que é reinjetado se perde definitivamente”, diz o representante da indústria.
Na semana passada, diversas associações do setor industrial e de segmentos afetados entregaram ao deputado Laércio Oliveira (PP-SE) uma carta de apoio à aprovação da Lei do Gás. O projeto de lei, relatado por Laércio, já teve requerimento de urgência aprovado e espera votação no plenário da Câmara. Depois, ainda terá que passar pelo Senado antes de seguir à sanção presidencial.